Não demorou a perceber que grande parte das portas não tinham fechaduras grandes o suficiente para que se olhasse através delas, como via nos desenhos animados. E isso o incomodou.
Queria tocar a campainha das casas que mais lhe despertavam curiosidade, mas acabava apenas olhando, tentando imaginar o que havia lá dentro. Se era uma família grande, uma família pequena, só o dono e seu gato. Ou se era algo mais macabro, como uma sala vazia com paredes manchadas de sangue, com apenas uma cadeira de madeira no centro. As vezes podia nem ter nada, ser uma casa abandonada que não teve tempo de ceder e se desfazer. Ou podia ter muitas coisas, tantas que ele não conseguiria ver tudo nem se conseguisse entrar.
Sua inquietação lhe perseguiu a vida inteira, mas a partir de certa idade parou de guardá-la para si. Começou a fazer desenhos a caneta em papel e colá-los com durex nas portas, esperando que com aquilo o morador sentisse tanta curiosidade quanto ele sentiu.
PS: Esta é a foto da minha porta, e o que tem atrás dela. Com isso retribuo o desenho que ele me deixou.
, Ella A.